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Hong Sang-soo é um cineasta de poucas palavras. Dono de um cinema que não se preocupa em se igualar às linguagens mais utilizadas mundo afora, seu domínio da Sétima Arte é visível em apenas uma das cenas deste “A Mulher que Fugiu”: em um jantar em um dia qualquer, duas mulheres conversam sobre amenidades, e transformam suas vidas em um espetáculo que vai muito além do que a câmera móvel captaria. No plano fixo, os detalhes estão por trás dos suspiros, dos trejeitos com a boca, do posicionamento das mãos.

À primeira vista, o filme é um convite ao espectador mais acelerado se entediar em cinco minutos, mas, por conta do talento do cineasta, responsável pelo roteiro e, definitivamente, pelas simbologias por trás de tantos encontros, é bem provável que se sinta preso sem saber ao certo o porquê. É simples, como tudo o que o cineasta constrói. As cenas são intrigantes porque grande parte de seus significados está por trás, está naquilo que está sendo apontado, apreciado, observado e analisado – e jamais mostrado. Com isso, o cineasta brinca com a curiosidade da rotina, com o significado das amenidades de pequenos momentos que poderiam acontecer com qualquer pessoa.

Assim, Gam-hee (Kim Min-hee) é a peça-chave que interliga todos os significados. A protagonista vai de um lugar a outro, apenas para bater um papo, viver sua vida, matar a saudade ou se alimentar. Não há grandes acontecimentos, assim como não há câmeras transitando para cima e para baixo, explorando todas as vertentes da linguagem cinematográfica. E o resultado disso é uma aula de cinema, porque Sang-hoo é habilíssimo em explorar cada tomada em seu máximo potencial. Em uma cena na qual a conversa ocorre à mesa, com um bloco de notas aqui, vaso cuja planta está acomodada acolá, e nada parece influenciar o cenário, na verdade, faz com que o espectador preste atenção à janela, cuja paisagem magnífica serve de contraste ao papo banal. Com um zoom, o diretor move quem assiste ao filme de um ponto a outro da narrativa, sem precisar de nada a mais para que isso aconteça.

Por sua vez, Gam-hee parece sentir o poder da aleatoriedade de seus gestos, como se soubesse do impacto sutil que causa às pessoas. É como se ela fosse uma peça motora, e despertasse para a ação, qualquer que seja, objetos inanimados que se transformam em humanos. Como se estivessem em um jogo de simulação de realidade, e precisassem de estímulo do jogador para efetuar suas tarefas. O mais interessante, porém, é a brincadeira trazida pelo nome do longa, pois se trata da mãe da vizinha da amiga da protagonista: eis a mulher que fugiu.

Com planos fixos e longos, o diretor permite que seu roteiro surta o efeito através das ações, e as palavras cumprem a função de preencher essas lacunas de maneira nada expositiva. O efeito disso é o retrato de realidades simples, entremeadas por uma mulher brilhantemente escrita, tão complexa quanto as verdades que profere – e que nem todas são acreditadas pelo espectador, aliás. Com isso, se por um lado é intrigante experienciar o que o cineasta deixou escondido do plano, e que protagoniza as diversas cenas apenas pelas ações de seus personagens, por outro a personagem principal faz com que as dúvidas se tornem ainda maiores.

No final das contas, é como se Gam-hee fosse a vizinha, a amiga ou a prima de todas as outras personagens, e que se embrenhasse sem que estas percebessem a naturalidade com que provoca o despertar de certos assuntos. Ao mesmo tempo, Gam-hee não é construída como alguém misteriosa, e sim como um tijolo essencial para pavimentar aquelas realidades. E tudo isso é feito pela excepcional fotografia, que transforma os planos fixos em verdadeiras metamorfoses. Tudo acontece enquanto nada parece acontecer, e o despertar que isso provoca no espectador está nos primórdios do cinema.

Hoje, porém, com toda a técnica desenvolvida e tecnologia disponível, Hong Sang-soo é o tipo de cineasta que mostra ao mundo como construir um trabalho excepcional, sobre a vida, as amenidades e a importância que têm para preencher o tempo de cada pessoa. Com o talento de Kim Min-hee, que se permite tornar-se complexa à medida que o tempo de tela sugere que isso aconteça, não é à toa que o resultado seja essa construção constante e latente do que é, de fato, excepcional na vida.

 

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_Fonte:
Denis Le Senechal Klimiuc
@rapadura